domingo, 8 de setembro de 2013

Como Tudo Começou – 3

As Figas
Élsie da Costa – 2 de setembro de 2013.


Era mês de agosto de 1973. Mês que se comemora o dia do Folclore. Alvoroço na sala de aula. As equipes se formaram para sorteio e distribuição dos temas do trabalho de pesquisa e apresentação oral sobre  manifestações do folclore brasileiro. Equipe 1, Capoeira, Equipe 2 Caiapó, etc. etc. etc. Eramos três na equipe: Marisa Bueno, Elza Campos e Élsie. Três amigas dessas que viviam grudadas. Tema sorteado: Congada. Distribuindo as tarefas, uma foi para a biblioteca, outra para o museu e eu?Adivinha onde eu fui? Para a rua... Pensei logo: - Porque não perguntamos tudo para aqueles que fazem a Congada? Procurei a casa onde morava a família do mestre violeiro. Período de início das fitas k7. O gravador foi emprestado do meu namorado. Comprei uma fita e lá fui eu... mamãe me levou de kombi até o Bairro da Ponte. Uma pequena vila com moradias muito humildes. Foi lá que conheci seo Amaro Moreto, mais conhecido como seo Mario, e sua esposa Dona Lurdes. Uma semelhança: a família grande. A filharada brincava pelo quintal da vila. Foi minha primeira entrevista aprendendo sobre a Congada. Eles foram muito gentis. Emprestaram fardamento, espada, instrumento, tudo para eu levar para a escola no dia da exposição oral. Cada grupo foi expondo o trabalho, e o professor ia dando a nota ao final de cada explanação. O nosso foi um dos últimos. Uma fez a fala inicial, a outra foi mostrando os pertences cedidos pelo mestre e eu mostrei a entrevista gravada. O professor, lembro-me bem, disse então, que acabara de  aprender algo: dar a nota somente após todas as apresentações. Isso por que um dos trabalhos já havia ganho nota dez. Então ele virou e disse para nós: a nota é dez, e não pode ser outra. Na aula seguinte, trouxe uma lembrança para cada uma de nós. Eram três figas, feitas artesanalmente. Ele deu uma aula sobre aquele símbolo. Guardei aquela figa por longos anos. Um dia ela desapareceu. As outras duas amigas seguiram outros rumos na vida. Três anos depois, eu telefonei para o professor a fim de saber se ele ainda tinha o trabalho escrito, porque eu gostaria de ter uma cópia. Ele então disse que não tinha mais o trabalho. Foi então que resolvi faze-lo todo de novo. Esse professor, deu grande contribuição na minha vida. Ele se chama Hermes Péricles Felippe. Durante as férias de dezembro e janeiro de 1975/76, me ocupei de ir ao Museu para pesquisar. A Dona Ivone foi muito atenciosa. Eu então, copiava a mão os manuscritos que ela me cedera, levava para casa e datilografava numa antiga máquina de escrever, também do meu namorado. Fiz isso várias semanas. Fui também à Biblioteca Municipal. Juntei um dinheiro e comprei um gravador Philips portátil, que por sinal era ótimo. Fui ao bairro do Portão, para gravar um ensaio da Congada Vermelha. Gravei uma música e o gravador encrencou. Daí por diante toda a pesquisa foi feita com um gravador semelhante, emprestado da Maria Pilegi Contesini. Grande amiga. Levei uns três anos documentando as congadas, fazendo um comparativo, de épocas, com os registros que buscara no Museu. Prancheta em punho e gravador a tira colo, eu anotava, gravava e o Walter Girardelli, meu namorado fotografava, em slides, com uma câmera Laica. Uma jovem de dezessete anos com tal ocupação não era um fato muito comum. E também quase ninguém se interessava por esse tema. Despertava certa curiosidade em algumas pessoas. Fui diversas vezes repreendida por meu pai. O que a Élsie está fazendo no meio dos congos? Bom lembrar, que naquela época não haviam mulheres dançando nas congadas. Para registrar a alvorada, saia escondida, de madrugada. Lembro-me do seo Quito dizendo: até hoje nunca vi ninguém na rua essa hora, para ver alvorada. O café da manhã das congadas não era na escola EMEI Florêncio P. Camargo. E eu, convidada pelo seo Quito, ia  tomar um café na Casa da Banda. Ressalto que, tanto os músicos da banda com os congadeiros, sempre foram muito respeitosos comigo. Com a publicação do livro Ternos de Congos e o registro da Ladainha no Santo Cruzeiro, chamou-se atenção para este momento dos festejos. Não havia relatos anteriores deste momento. Hoje, passados nada menos que quarenta anos, já se tornou corriqueira a participação das pessoas na reza da alvorada. E o interesse pelo tema foi ganhando mais adeptos.


Foto de Walter Girardelli Jr., de 1975, digitalizada de slide. 
Na época era caríssimo fotografar com slides.  
 Bem no cantinho à direita (próximo ao poste), 
eu aos 18 anos, fazendo minhas anotações. A pesquisa
 resultou no Prêmio Silvio Romero de 1978.  Era a procissão
das Bandeiras de São Benedito e Nossa Senhora do Rosário
saindo do bairro CTB. Nessa época a festa pertencia 
efetivamente ao povo. Até as bandeiras eram
pintadas por Dona Sebastiana.


Eu de novo, no canto à direita.
Segurando o estandarte, o popular Pinduia e na viola o seo Gentil,
o "bijuzeiro", que tocava viola sem uma das mãos.
Para ampliar clique na imagem.

Nenhum comentário:

Postar um comentário